terça-feira

Eu precisava de uma máquina de escrever, para escrever.
Precisava de cigarros, para escrever.
Precisava de um amor daqueles, para escrever.
Um livro genial, para escrever.
Eu queria uma chuva, não muito forte, para escrever.
Só podia ser no sábado, para escrever.
Estar bêbado e chapado, para escrever.
Que alguém morresse, para escrever.

Aí percebi que precisava de ideias,
para entender.

domingo

Uma linda hora para Grace

A poesia perdeu a graça.
O café não é mais tão bom.
Nolan tá uma droga.
Aquela banda, aquela que a gente gostava, sempre foi um lixo.
O sábado não presta.
Sair aos domingos é uma tragédia.
Quer saber? A semana toda não presta.
Tudo isso porque você é triste.

quarta-feira

Alegria, passageiro!

Olhos claros, sagazes, espertos, despertos
Vão direto num horizonte incerto.
Opa! Cintura danada, fininha
Empurra a catraca. Vem menina.

Rebola. Senta do meu lado
Se arruma, me bagunça.
Deixa o samba ligado.
Me olha! Vira loga essa cabeça.

Vem menina, se esquentar. Sai dessa.
Encosta logo, dá uma dose
Ou chama uma conversa.
Só vai ficar aí calada, fazendo pose?

Diabo. Vira logo essa cabeça!

sexta-feira

Junky Box

Esse povo é maluco
Depois de abandonados
Vão cheirar cola
Com as meninas da rua
Do outro lado
Batem na minha porta
Com pedras na mão
Querendo abraçar meu irmão.
Meu irmão!

quinta-feira

Mais nada

Abraços aflitos vejo ultrapassar
Todo aquele vazio
Que não quer calar.
O suspiro apaga a chama.
Olhos vazios e secos
Enegrecidos pela noite
São o verdadeiro açoite
Quando querem aplacar.

A flor do norte

Quero escarnecer todas as vívidas paixões
(Aquelas que não são vividas por mim)
Um desatino para toda santa piedade
E lhe mostrar a verdadeira santidade duma meretriz.

Abraça-me. Esqueça que estou sujo e me abraça!
Sonhe muito, sonhe como vai ser eternamente feliz
E quando acordar verás como é triste ser feliz.

Com grande pesar se desabrocha a flor do norte.
Vamos ao norte! Num avante sádico.
Que todas as lembranças sejam um corte.

Avante!
O mal vai desabrochar.

Pensei em te escrever uma poesia de amor

Aí uma voz seca soa na mente.
Não libera uma simples calma.
Nunca vai, recomeça somente;
Se condenar, ninguém se salva.

Uma face brilha como o sol solitário
Que assiste à nossa demência
E queima sem calor solidário.
Até um riso pesa como uma penitência.

São tantas tardes débeis. É dia,
Já sonho com sua esfinge nua,
E dança como louca, dança como vadia.
Não sabemos de nada, vamos para a rua.

Não rimo mais porque não sei.
As brancas folhas de meu caderno
Pretas ficam com tanta besteira.
Olha, ainda sobrou uma rima: Inferno!

sexta-feira

Noite


Sou a devoradora dos deuses esquecidos;
Amante dos suspiros curiosos; Maestra dos tempos ociosos.
O tempo em suas mãos esperançadas
Passa leve e atormentado em horas vãs
Sendo amiga dos seus silêncios tenebrosos.

Abra os meus seios com seus suspiros
E saboreie da carne mais insana e saborosa
A palavra mais vitoriosa não se ama:
Em meus silêncios, não há uma só palavra amorosa.
E depois de ter invadido minha carne com sua alma
Só encontrará e se saciará da mais áspera desesperança.

Criança ore desamparada sobre a face da cama
Pressione suas lembranças contra o peito esmorecido
Suas saudades são válidas porque matei todos os seus dias.
Dias em que acordou assistindo ao próprio deus ser devorado
Em agonia vendo que era esquecido.

Olhe para o céu, pergunte se todo aquele sol
Após todo anoitecer é realmente merecido.

domingo

Sobrevivente

Com o passar do tempo acabei me tornando uma criatura
Indiferente a si, ciente de nada.
A noite, que me fora uma hora bela, nada mais me é que uma hora escura.
Tento ouvir e pouco ouço desta cabeça calada.

Minhas euforias não são mais eufóricas;
Minha angústia esvai-se menos angustiante.
E assim vão: pobres, aquelas emoções ricas
E seco de tanto não ser constante.

Sou criatura, sobrevivente.
Pobre corpo, em pouca alma familiar.
Assim vou: não caminho, mas sigo em frente,
Penso em seguir, contudo sigo sem pensar.

sábado

Lucius - I

Quando a criatura subiu aos céus,
Todos uniram-se para ver o esplendor.
E unidos aclamaram:

"Lá estará a conquista da quimera:
Vá! Nem com má sorte, nem com horror.
Sobe! Pois aqui já rasgara todos corações!
Golpeia! Pois aqui não tem mais dor!"

Quando caiu,
Todos os unidos ainda fitavam os céus em clamor
E a criatura caída, todos esqueceram.